As últimas aventuras antes dos dias começarem a mingar e a noite tomar o seu lugar

Este Verão trouxe-me várias vontades novas mas acima de tudo catalizou as vontades que trago comigo há muito tempo. Vontades que não se separam de necessidades e vice-versa. 

Apesar de verem aqui uma Alice de enxada na mão, devo admitir que nos últimos tempos estive bastante afastada dela. Escolhi o campo juntamente com o André e inicialmente ( especialmente na Serra da Estrela, antes de ser mãe ) aprendi a lavoura com as mulheres daquela terra, fui pastora e dei-me à experiência. No entanto, desde que o meu filho mais velho nasceu fui me afastando da lide campestre progressivamente. De repente a minha zona de conforto passou a ser quase exclusivamente a casa e saía para colher o que o André plantasse ou as plantas espontâneas que sempre cresceram por onde andamos. Tudo o que fosse fora de casa era tarefa do André e eu cuidava da casa, das crianças, e das alquimias da cozinha. ATENÇÃO, tudo isto porque queria e não por uma questão de machismo ou feminismo.

Os meses e os anos passaram e sem querer fui-me encostando a essa forma de estar.

Poderia estar tudo certo mas ultimamente a vida tem-me pedido de forma muito clara para tomar as rédeas do sonho e expandir o território confortável da ”casa” para o resto da quinta. 

Hoje, juntamente com as crianças fomos fazer o que tinha que ser feito, alimentar os animais e dar-lhes um pouco de presença humana ( usufruindo muito da deles também!! ). Já há alguns dias que andava com vontade de limpar o galinheiro e a casa das cabras e hoje foi o dia. 

Quando estava a limpar, com as crianças sempre de volta de mim, havia um misto de ”blhec” na cara deles com a excitação de estarem ali a brincar com as galinhas.

Em conversa com mais velho chegamos à conclusão de que de facto ” o estrume é o ouro da terra” como bem dizia a minha amiga Maria Feliz. No decorrer do diálogo percebemos juntos quão incrível é a Terra que no seu eterno ciclo tudo transforma. Como é que algo que é potencialmente perigoso para os humanos ( o cocó com todas as suas bactérias ) é ao mesmo tempo essencial no ciclo dos nutrientes e na transformação da Vida? É mesmo tudo uma questão de perspectiva não é?

Mas nem só de campo vivemos nós e decidimos ir fazer uma vista ao Museu Amadeo de Souza Cardoso ( mais uma ). Claro que os pequenos fizeram do museu um parque de diversões, o que me fez questionar a utilidade de os levar lá. Creio que apesar de tudo a arte de museu ainda pode ter a capacidade de acordar alguns espíritos mais adormecidos e que uma visita ao museu pode mesmo ser educativa. 

Na sala dedicada a Acácio Lino ( onde eles inventaram um escorrega ) eu pude confirmar mais uma vez a história da vinha aqui em Portugal. Na realidade essa pintura nem sequer pretende descrever as vindimas mas sim retratar uma jovem amuada, por isso aprendi que até mesmo sem querer a arte diz sempre muito do seu tempo e do seu espaço. 

Estamos em altura de vindimas e eu posso dizer com muita certeza que recusarei qualquer vinho feito nesta região neste ano de 2023. 

Apesar de a maior parte das pessoas terem as adegas cheias de vinho dos anos anteriores, ainda lhes parece um ultraje não ter uvas um ano e por isso quase todas as vinhas tiveram cerca de 10 intervenções com produtos químicos. 

A pintura de Acácio Lino mostra bem as alterações que a vinha portuguesa tem sofrido e o porquê de chegarmos a um ponto onde a vinha não é produtiva. As vinhas são lianas e necessitam de árvores para trepar! Principalmente numa região chuvosa como esta de Entre-douro-e-minho. ( Vejam nas fotos como eram antigamente as vinhas! )

Reparem bem no tamanho dos escadotes e no pormenor da vinha a subir esta árvore! Nada de monoculturas e vinhas baixas altamente susceptíveis a fungos e outras doenças! ( Mas talvez um dia destes o André possa escrever mais sobre isto !)

E por falar em arte, esta semana também fizemos mega experiência de criarmos o nosso carvão para desenhar de raiz. 

É tão simples e no entanto sinto que nos traz bastante preenchimento. 

Apesar de vivermos numa sociedade de especialistas acredito que a especialização tem a grande contrapartida de nos retirar da percepção do todo. 

Aprender e perceber como funcionam os materiais e ainda por cima saber que podemos criar a partir da Natureza selvagem 

aquilo que precisamos sem grande recurso a tecnologias complicadas é para mim essencial. Além disso é algo que as crianças adoram, principalmente quando os elementos estão envolvidos.

A partir duma lata com um furo, pequenos ramos verdes descascados de salgueiro e carvalho, alguma caruma e lenha conseguimos fazer barras de carvão muito eficientes. 

É uma aprendizagem muito divertida e uma atividade onde ele e ela puderam facilmente estar envolvidos e fazer parte do processo.

Numa das nossas idas à horta decidimos que iríamos fazer novos incensos para a nossa casa. É algo que gosto sempre de ter porque sinto que é algo que para além de aromatizar a nossa casa rapidamente se transforma num pequeno ritual que eles gostam de participar. 

O fogo é realmente um elemento que nos chama com muita força, talvez porque precisemos da sua energia transformadora no nosso dia-a-dia. 

Numa das últimas vezes que estive à volta do fogo, que o acendi e o observei, percebi que o seu poder é enorme e que como tudo temos que ter a capacidade de o dominar para que não consuma rapidamente tudo o que o rodeia. Quando o acendi vi um fogo esfomeado capaz de transformar sem parar e por isso parei, respirei fundo e controlei-me, controlando-me consegui dominá-lo também e permitir que ele transforma-se aquilo que precisava de ser transformado. 

Fizemos incenso com algumas plantas que crescem na nossa horta, rosmaninho, salvia e eucalipto. Todas estas plantas têm um uso histórico na purificação e protecção. A prática da defumação é mesmo muito antiga e acredita-se que tem a capacidade de limpar o campo energético de energias negativas. Ao fazê-lo, sempre com a mente focada na limpeza e na purificação, sinto que de facto a energia do espaço ou a nossa energia fica renovada. 

Os pequenos adoram defumar e abanar as ervas que deitam fumo e por isso o mais velho fez o seu primeiro incenso de forma totalmente autónoma. Cortou as plantas da horta, juntou-as e embrulhou-as no fio! 

 

E AINDA… Fiz umas calças de linho!! 

Num dos passeios pela cidade encontrei uma loja que vendia uns tecidos 100% linho muito bonitos. Já há muito tempo que queria voltar à costura e este foi o primeiro projeto que decidi abraçar. Adoro roupa de linho mas comprá-la já feita pode ser bem caro. 

Por 12€ e 3 horas de trabalho (agradável) fiz umas calças super confortáveis, simples e bonitas. 

A sensação de fazer a própria roupa é sem dúvida empoderadora. Quem sabe um dia destes planto, fio e teço o nosso próprio linho? A minha avó era filha de lavrador aqui da aldeia ao lado da que vivo agora. Ela era a irmã mais nova e casou muito cedo, contava-me que todas as suas irmãs eram fiadeiras e tecedeiras do linho que o pai cultivava! A minha avó chamava-se Alice, como eu, e ainda hoje a sinto como a guardiã deste espaço que cultivou quando era mais nova. 

Bem, fizemos ainda muitas mais coisas, dentro e fora da quinta mas escolhi estas para partilhar. 

Partilho porque acredito que de alguma forma vos pode dar algumas ideias para fazerem com as vossas crianças e no vosso dia-a-dia! 

No Domingo vamos estar com uma banquinha na inauguração do espaço dos nossos amigos, Sara e Lourenço.

Têm um projeto incrível, o Centro Interser, onde animais e seres humanos estão juntos na evolução e trabalham para um mundo mais equilibrado.

Partilho o cartaz com os contactos, ainda vão a tempo de se inscreverem. 

Nós vamos estar lá com medicinas naturais, as minha ilustrações, kombucha e cosmética natural também!

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